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Seeing the Forest for the Trees Polycentric Climate Governance in the Amazon
The Amazon is rapidly approaching its tipping point, which could turn the tropical rainforest
into a dry, carbon-emitting savannah, with catastrophic impacts well beyond the South American continent and its inhabitants. The region is facing a nowadays familiar challenge of
combating climate change and promoting social justice. International climate governance is
proving ineffective, as it fails to incorporate the long term wellbeing of local communities.
Demands for justice have led to calls for more polycentric climate governance (PCG),
characterized by multiple independent governance units and a place-based approach to dealing
with the possible consequences of climate change. It, however, remains unclear if PCG has also
led to more justice, especially in recognizing the value of diverse epistemologies and ontologies
with regard to climate change and the creation of the Pluriverse: a world in which multiple
worldviews fit. In the culturally diverse Amazon, to what extent can paths based on PCG lead
to more justice? Aiming to answer this question, this study examines two examples of
subnational climate governance and indigenous peoples’ participation in the Amazon as its case
studies: the State of Acre in Brazil and the regional department of Ucayali in Peru. Based on a
qualitative content analysis of semi-structured interviews and relevant policy documents, this
study highlights three challenges that need to be addressed for PCG to foster environmental
justice: 1) filling governance gaps; 2) increasing meaningful participation; and 3) overcoming
epistemic injustices and recognizing alternatives to the hegemonic neoliberal model. Bridging
polycentricity and interculturality, diverse systems of knowledge and their adherents need to be
better appreciated and incorporated as part of the process of reassessing the purpose of PCG.
Only then, will we see the handling of the future of the Amazon in a holistic way: so much
more than mere carbon storage.As interações complexas entre a desflorestação local e as emissões globais de gases com efeito
de estufa determinam os potenciais cenários do futuro da floresta amazónica. A Amazónia está
a aproximar-se rapidamente de um ponto de viragem crítico, arriscando transformar-se numa
savana e assim passar de floresta que captura carbono a território emissor de carbono. Essa
transformação teria consequências drásticas, que iriam muito além do continente sul americano, da sua biodiversidade e dos seus habitantes.
A região amazónica enfrenta, portanto, o duplo desafio do combate às alterações
climáticas e da promoção da justiça social. A governança climática internacional mostra-se hoje
incapaz de garantir o bem-estar, a longo prazo, das comunidades locais. Com esta necessidade
de justiça crescem os apelos a uma governança climática policêntrica (GCP), caracterizada por
vários centros de tomada de decisão independentes.
A GCP, termo cunhado pela cientista política Elinor Ostrom, assenta na ação local,
valorizando, entre outros fatores, o poder dos governos subnacionais, da sociedade civil, das
entidades privadas e das iniciativas transnacionais, para lidar com as possíveis consequências
das alterações climáticas. No entanto, não é ainda claro se a GCP conduz também a uma
intervenção mais justa, especialmente no que se refere ao reconhecimento do valor das diversas
epistemologias e ontologias associadas às alterações climáticas e à criação do “Pluriverso”: um
mundo em que coexistem múltiplas cosmovisões.
Numa Amazónia tão culturalmente diversa, até que ponto pode a GCP levar a transições
mais justas? Com vista a responder a esta pergunta e compreender o impacto da GCP na
(in)justiça Amazónica, esta investigação têm quatro objetivos: 1) ler a Amazónia à luz da
literatura sobre GCP; 2) identificar a territorialização da GCP e quão justa esta é; 3) analisar
como as ontologias e epistemologias locais (indígenas) são incorporadas na GCP; e 4)
recomendar políticas climáticas mais justas e inclusivas da diversidade cultural.
Para estudar a GCP na Amazónia, esta investigação emprega uma metodologia
qualitativa, assente em dois exemplos de governança climática subnacional na Amazónia como
estudos de caso: o Estado do Acre no Brasil e o departamento regional de Ucayali no Peru.
Ambos são vistos como pioneiros na governança climática intercultural nos seus contextos
nacionais, e estabeleceram grupos de trabalho indígenas integrados nos seus mecanismos de
governança regional com vista à promoção da justiça intercultural. Cumulativamente, ambos
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são membros da “Força Tarefa de Governadores para o Clima e Florestas” (GCF), uma rede
para a colaboração subnacional na proteção das florestas tropicais.
Durante o trabalho de campo, executado o período entre agosto de 2018 e janeiro de
2019, foi realizado um total de 65 entrevistas semiestruturadas (Acre n=26, Ucayali n=39) com
os principais atores da GCP, incluindo representantes dos governos subnacionais (municipal e
regional), das organizações não-governamentais, do setor privado, das organizações indígenas,
das iniciativas transnacionais e das universidades. Além das entrevistas utilizaram-se, como
técnicas de recolha de dados, a observação participativa e a análise documental. Todo o material
documental (entrevistas, notas do trabalho de campo e da observação participativa, e
documentos) foi analisado qualitativamente por meio do programa de software MAXQDA.
Os resultados obtidos mostram uma evolução diferenciada das soluções de GCP entre
Acre-Brasil e Ucayali-Peru. Uma análise comparativa das oportunidades e desafios para a GCP
destaca a importância dos seguintes fatores: a continuidade e estabilidade política; os
ajustamentos e acordos mútuos na governança multinível; a conceptualização holística,
multiator e multissetorial do desafio das alterações climáticas; um foco não apenas na
mitigação, mas também na adaptação climática; e uma inclusão social efetiva e não somente
dos grupos que falam a mesma linguagem que o governo.
Em segundo lugar, os resultados sublinham a dimensão espacial da GCP, o seu potencial
e também o seu risco para soluções de governança mais justas. Esta investigação foca-se em
três exemplos emergentes na Amazónia: 1) Cidades amazónicas: A governança climática
urbana desempenha um papel vital na GCP, não sendo, porém, muitas vezes levada em
consideração. Além disso, políticas contraditórias ao nível local, regional e nacional limitam a
promoção de uma GCP mais justa; 2) Iniciativas climáticas transnacionais: embora a
experimentação com iniciativas transnacionais tenha levado a GCP a incorporar crescentemente
a justiça enquanto princípio operativo, a sua dependência de financiamento internacional
condiciona a sua imparcialidade; e 3) instrumentos de política pública territoriais: embora estes
sustentem um ordenamento do território ajustado à governança climática, os seus mapas e bases
de dados raramente são utilizados para orientar as decisões dos atores locais.
Em terceiro lugar, os resultados enfatizam a importância de levar em conta a dimensão
cultural da GCP e as perspetivas e epistemologias indígenas face às alterações climáticas. As
cosmovisões indígenas possuem uma conceção mais holística da terra e destacam a importância
do cuidado ancestral e da espiritualidade. Tanto no Acre como em Ucayali estabeleceram-se
grupos de trabalho indígenas (GTI) para promover o diálogo entre o governo subnacional e os
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povos indígenas. No entanto, esses GTI não levaram necessariamente a uma participação
efetiva e significativa, nem foram capazes de desafiar uma perspetiva hegemónica da política
climática.
Por último, esta investigação fornece recomendações para uma GCP melhorada que leve
em consideração as dimensões da justiça. Estas recomendações são baseadas nas visões
diversas, e muitas vezes conflituantes, de uma Amazónia segura e justa, apresentadas nas
entrevistas com os atores da GCP no Acre e em Ucayali. As recomendações, juntamente com
os respetivos destinatários, foram organizadas em quatro categorias: 1. Enquadramento e
conceptualização das alterações climáticas; 2. Interculturalidade; 3. Colaboração intersectorial;
e 4. Territorialização.
À luz da literatura e do meu quadro teórico-conceitual, a interpretação destes resultados
destaca três desafios incontornáveis para a promoção de justiça via GCP. Em primeiro lugar, o
preenchimento de múltiplas lacunas de governança que dificultam os processos de ajustamento
recíproco e a integração intercultural e social na GCP. Na GCP atual falta uma perspetiva local
amazónica. Além disso, a GCP amazónica trata a ação climática separadamente de outros
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), carecendo de uma visão coerente das suas
múltiplas interações.
Um segundo ponto de discussão é a falta de uma participação significativa da sociedade
civil na GCP. Um olhar crítico na relação intrínseca entre governança participativa e dinâmicas
de poder enfatiza o risco potencial das políticas de participação. Embora tanto no Acre como
em Ucayali sejam utilizadas abordagens participativas e tenham sido estabelecidos GTI, nada
garante que as exigências, preocupações e ideias da sociedade civil em geral, e dos
representantes dos povos indígenas em particular, sejam levadas em consideração. O poder de
tomada de decisão permanece nas mãos da "elite do poder tradicional”.
Em terceiro e último lugar, para que a GCP resulte em processos mais justos, certas
injustiças epistémicas precisam de ser ultrapassadas. Para que tal aconteça, é necessária mais
reflexão sobre “a política de governança do conhecimento” em relação às alterações climáticas,
incluindo as relações socio-históricas, culturais e políticas, e os desequilíbrios de poder na
coprodução do conhecimento. Tal implica uma descolonização da GCP com vista à sua
reconstrução epistémica e a criação de uma variedade de novas narrativas climáticas,
desvinculadas da narrativa hegemónica da modernidade e do modelo neoliberal. Também
implica remover barreiras à autodeterminação indígena e ao acesso à terra e a articulação das
perspetivas de grupos indígenas agora excluídos.
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Para concluir, são apresentados três tipos de recomendações para investigação futura.
Recomendações relacionadas com: 1) a natureza da investigação: focar-se mais na investigação
qualitativa e exemplos empíricos de GCP; 2.) o objeto de investigação em GCP: concentrar-se
mais em regiões onde coexistem várias epistemologias e ontologias; e 3) a abordagem teórica
de investigação em GCP: recorrendo à literatura emergente sobre a Teoria da Governança
Evolucionária e as perspetivas feministas sobre a governança climática.
Esta investigação teve como objetivo fazer um balanço das várias narrativas sobre as
alterações climáticas, a sustentabilidade, a floresta amazónica e seus habitantes, e respeitar a
pluriversalidade do mundo. Conceptualmente, examinou as implicações das soluções de GCP
na promoção da justiça. Empiricamente, ofereceu exemplos da dinâmica local da GCP na
Amazónia. E normativamente, forneceu recomendações para uma GCP amazónica que leve em
consideração as exigências de uma governança justa e inclusiva. Só então podemos “ver a
floresta para além das árvores”, e perceber que a floresta amazónica é muito mais do que um
mero instrumento de captura e armazenamento de carbono